9.1.05

Resposta a Armila

A propósito da Falsa História, Armila perguntou:
pensando obviamente na clara relação entre a localização temporal daquele que escreve e o modo pelo qual os assuntos são abordados, não acha válido pensar esses livros como um reflexo do pensamento da contemporaneidade? O que levaria a enquadrá-los nas idéias de senso comum dos tempos atuais?
Concordo em absoluto com a ideia de que obras como O Código da Vinci ou A Verdadeira História de Jesus reflectem o pensamento da contemporaneidade... No entanto podemos entender esse reflexo de dois modos: se é o reflexo das estruturas sociais que se reproduzem inconscientemente na linguagem, estaríamos a cair num determinismo próprio dos materialismos; se é reflexo, e como me parece ser, das idéias de senso comum dos tempos atuais, então eles revelam uma exploração (ora mais comercial, ora mais ideológica) do abaixamento do olhar de uma modernidade que trocou o dever ser pelo ser (o ought pelo is, como diria Hume); que se deixou levar pela suspeita de que não vive a sua vida, de que alguém a tenta enganar.
Onde está a verdadeira história? A verdadeira história está, parafraseando S. Tomás, na adequação entre a coisa [histórica] e o intelecto. O que César das Neves explica é que o melhor instrumento para conhecer a história (neste caso, a da vida de Cristo) são os textos da época mais credíveis... e a interpretação deve ser feita sobre esses documentos e não sobre, por exemplo, os textos piedosos dos místicos castelhanos do século XVI.
A História é um intriga que a nossa vida tenta descortinar. Em torno dessa intriga construímos, decoramos, embelezamos (ou desfeamos e destruímos)... mas o facto está lá. Pode ser inacessível, mas é incontornável. Há um compromisso racional com o real sem o qual entraríamos no universo da arbitrariedade.
Eu acredito no valor objectivo do real: acredito que para além do texto (de qualquer texto) há uma realidade que eu entrevejo e que me vincula. A dogmatic belief in objective value is necessary to the very idea of a rule which is not tyranny or an obedience which is not slavery. (C.S. Lewis, The Abolition of Man)

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