26.3.11

Actualidade das Virtudes Humanas

Há algum tempo falava com um amigo sobre temas de educação. Contava-me ele que, em casa de certo industrial, os filhos só bebiam Coca-Cola nos dias de festa. Em todos os outros bebiam água. Fiquei pensando como em muitas casas há a preocupação de dar diariamente aos meninos, o suminho, o iogurte, as gomas, o bolinho, o leitinho pela palhinha…

A minha formação histórica fez soar campainhas. Claro. O industrial formava uma geração de elite, uma dinastia educada na exigência, no esforço, na renúncia, apta a dirigir e a liderar enquanto, que em muitas famílias, o “bom coração”, forma meninos “copinho de leite”, habituados a ter tudo sem o mínimo esforço, hedonistas, cheios de necessidades desnecessárias, incapazes de lutar, dispostos à submissão para “negociar” os medíocres apetites da sua existência, aptos a ser servidores dos novos senhores.

Nas sociedades humanas, o crescimento nas virtudes é mais fácil ou mais difícil consoante a mentalidade que as informa e determina o seu progresso ou decadência. Foi assim com os Impérios do Próximo Oriente, com a Grécia e Roma, com o Nominalismo no final da Idade Média, o Racionalismo reducionista do Renascimento que conduziu ao Absolutismo Monárquico, ao Liberalismo e ao Período das Ideologias Totalitárias que dominou grande parte do séc. XX.

O mundo abastado atravessa hoje uma profunda crise que aparentemente, é de reestruturação económica e financeira mas que, no seu íntimo é resultado do esquecimento dos valores próprios da natureza humana. Parece que a esta não se aplica a tão apregoada necessidade de defesa dos valores ecológicos.

Por esse motivo vivemos numa sociedade doente em que “para os ricos há o Estado; os pobres terão de se governar com o mercado”(Atílio A. Boron). Em consequência, vive-se numa inversão de valores, numa sociedade egoísta e insolidária que se manifesta na insegurança dos cidadãos quanto ao respeito pelas suas vidas, principalmente da vida dos mais frágeis e dos legítimos bens garantes da sua sobrevivência. Na vida empresarial esquece-se frequentemente que a dimensão económica é condição para que se possam alcançar objectivos não apenas económicos mas também sociais e morais porque a empresa não é apenas “uma sociedade de capitais” mas, principalmente “uma sociedade de pessoas” em que os trabalhadores são o seu património mais precioso e o factor decisivo da produção. Recorde-se que a liberdade económica é apenas um elemento da liberdade humana e que quando aquela se torna autónoma perde a sua necessária relação com a pessoa e acaba por aliená-la e oprimi-la. Consequentemente, é necessário trazer para o dia-a-dia das nossas vidas o exercício de importantes virtudes como a diligência, a laboriosidade, a prudência, a confiança e fidelidade, a coragem... (1)

Consequentemente é necessário recordar as virtudes humanas, aquelas virtudes próprias da nossa natureza e que é necessário desenvolver para sermos mais e melhores pessoas.

Dos pais e educadores espera-se que ajudem os filhos e educandos a potenciar a vivência das virtudes humanas, “hábitos operativos bons” (David Isaacs) que, pela repetição, tornam mais fácil a prática do Bem e evitam a prática dos vícios. A pessoa humana é uma unidade e, a melhora numa virtude, ajuda a melhorar toda a pessoa enquanto o vício a degrada e torna mais difícil a sua realização pessoal. Só com rebeldia educativa, a rebeldia em função dos valores de sempre – que se concretiza pelo desenvolvimento da capacidade de se informar e formar; de pensar por cabeça própria; de fortalecer a vontade: de viver de acordo com ideais valiosos - poderemos, algum dia, passar de uma sociedade egoísta para uma sociedade solidária, aberta aos outros, e construir a “Civilização do Amor” que defendia o saudoso Papa João Paulo II.

(1) Cfr. Compêndio de Doutrina Social Da Igreja, págs, 218,226